Dragon ball movie...

Dragonball Evolution

Quando soube que Hollywood se preparava para fazer uma adaptação live-action de Dragonball, chorei um bocadinho por dentro. Fui acompanhando os trailers que saíam e à medida que novas cenas eram reveladas, mais eu chorava por dentro. Fui fã da série em miúda e é daquelas séries que apesar de hoje reconhecer que aquilo não era a obra-prima que acreditava ser, ainda tem direito a estar no meu cantinho de boas recordações. Sabia que era impossível adaptarem fielmente a série. As diferenças eram demasiadas, sendo a principal o facto de a animação permitir coisas que um live-action nunca conseguiria transmitir. Portanto, as minhas expectativas para este filme eram bastante baixas, ainda que após tê-lo visto, tenho de admitir que ele as superou. É bem pior do que eu esperava.

A série Dragonball Z nem tinha uma história muito complexa. O Songoku era o bom e tinha um bom grupo de amigos, aparecia o mau da fita, ameaçava destruir o mundo porque sim e o Songoku após 100 episódios, derrotava-o. Simples e eficaz. Então porque é que esta fórmula não resulta nesta adaptação? Na minha opinião, porque as personagens originais foram esquartejadas, queimadas, ressuscitadas pelo dragão só para serem novamente esquartejadas e queimadas num processo de americanização completamente desprovido de sentido. O Songoku tem direito a uma nova abordagem e é agora um adolescente americano completamente estereotipado, atormentado na escola por bullies e com dificuldades em falar com raparigas – nomeadamente com a Kika, que é a rainha da popularidade na escola. O vilão do filme, o Coraçãozinho de Satã, e com todo o respeito que eu tenho pelo James Marsters (quem não se lembra do Spike, na série Buffy), é uma personagem completamente oca e vazia, acompanhado por uma ainda mais oca e vazia Mai, que trabalha para o Coraçãozinho de Satã sem o espectador nunca ter direito a uma explicação do porquê dessa situação. O Tartaruga Genial, cada vez que está em cena, mais parece que está a praticar dança interpretativa – a sério, porque é que para fazer um Kamehameha é preciso dançar a Macarena? Enfim, cada uma é pior que a outra, ainda que nada chegue aos calcanhares do ridículo argumento.

Há cenas completamente absurdas e sem nexo. Há de tudo, desde o Songoku a mexer dois dedos e a abrir todos os cacifos da escola ao mesmo tempo, usando os seus poderes telecinéticos a um dos bullies conseguir fazer um air kick, (pff, quem não consegue?), passando pela cena que mostra o Tartaruga Genial a viver numa casa vitoriana no meio de uma cidade futurista (óbvio!). Ah, mencionei que o Songoku consegue sentir a presença de uma bola de cristal e quando lhes toca, ele tem visões do futuro? E que tal a melhor cena do filme: eles vão muito bem estrada fora e caem num buraco, que se vem a revelar ser uma armadilha preparada pelo Yamcha, que lhes quer extorquir dinheiro. Songoku, Bulma e Tartaruga Genial ficam lá presos no buraco até anoitecer. Devido ao frio, fazem uma fogueira e o Tartaruga Genial decide contar o passado utilizando a mesma fogueira para magicamente projectar imagens. Momento de reflexão. Yamcha aparece, há um momento de conflito e subitamente o Tartaruga Genial manda um salto gigante, sai do buraco sem grande esforço e diz:

“Enough games! We have no time to waste.”

…

Err…

SE CONSEGUIAS SAIR DO BURACO ASSIM TÃO FACILMENTE PORQUE É QUE NÃO O FIZESTE LOGO?! PORQUE É QUE PERDESTE UM DIA INTEIRO A FAZER FOGUEIRINHAS, A ASSAR MARSHMALLOWS E A CONTAR HISTÓRIAS DE TERROR?!

Sinceramente. Aquilo não é um buraco no chão. É um buraco no argumento.

Tenho de admitir que houve uma cena que me fez rir. O momento em que eles chegam a vale com um enorme rio de lava (de novo, a originalidade no seu melhor). Aparece o Alien. Sim, o Alien. Que nasceu do Coraçãozinho de Satã, depois deste se sentar na cadeira do Darth Vader e tomar esteróides. Enfim. Aparece o Alien e uns quantos clones deste e lutam com as personagens. Durante a luta, e visto que precisam de atravessar o rio de lava e não existe nenhuma ponte de madeira a abanar com três ripas soltas, Songoku tem uma ideia. Ele pega nos Aliens derrotados e atira-os para o rio de lava, onde ficam a flutuar suavemente em agonia, logo, criando uma ponte para o outro lado. Não é inteligente? O Chuck Norris ficaria orgulhoso.

Mas voltando ao nível de idiotice normal do filme. Há também a cena em que eles caem de um precipício e fica toda a gente mega-aleijada e face ao perigo iminente que o Coraçãozinho de Satã impõe. Ora nesta situação, qual é a primeira preocupação do protagonista? Vestir o uniforme laranja. E ainda bem que o vestiu porque 30 segundos depois, transforma-se no King Kong (aparentemente, o fato de macaco usado aqui é o mesmo utilizado no filme homónimo dos anos 30) e desfaz o uniforme em pedaços. Não, espera. Ele apenas fica aberto. Continua a servir nos ombros. E olha, ele conseguiu voltar ao normal. E o uniforme está de novo impecável e sem vincos. Fantástico!

O próprio final do filme é completamente absurdo. O desejo que o Songoku pede ao Dragão é para reavivar o Tartaruga Genial, que havia morrido durante esta última batalha. O avozinho que o criou por 18 anos, o ensinou a lutar, que o guiou nas visões manhosas que ele teve durante o filme e por quem ele tinha jurado vingança que se f*da. Aquela pessoa que ele conhece há dois dias e que a ensinar-lhe a técnica do Kamehameha foi menos útil do que uma caixa de bolachas é bem mais importante.

Fora todos os momentos absolutamente clichés e previsíveis. Alguns exemplos:

. “Kika: You’re different. I like different. (…) I know it’s hard to believe but… we’re alike.”. Cliché: 1, Argumento: 0.

. O Coraçãozinho de Satã mata o avozinho do Songoku. O Songoku chega à cena do crime e encontra o avozinho moribundo que lhe diz para encontrar o Tartaruga Genial e salvar o mundo de um apocalipse iminente, morrendo logo a seguir, logo, despertando o desejo de vingança no protagonista. Cliché: 2, Argumento: 0.

. Montagem de treino durante uma roadtrip com paisagens grandiosas ao som de música épica. Cliché: 6, Argumento: 0.

. Experiência à beira da morte sentida pelo Songoku. Visão do avozinho. Segue-se discurso do “Avôzinho, como posso derrotar o mau? / Tens de ter fé em ti mesmo.” Ah, já agora, é aqui que o Tartaruga Genial cura o Songoku com um Kamehameha (não era genial que isto pudesse ser feito na vida real? “Ó meu Deus, ele não tem pulso! Tragam o desfibrilador! / Não é preciso! KA-ME—HÁ-ME—HÁ!!!! / Ele está vivo! Obrigada, senhor!”).

. A Bulma e o Yamcha passeiam e olham para baixo para um mundo feliz e ignorante, e discutem como é bom viver sem o peso de saberem que o mundo vai acabar no dia seguinte e que o têm de salvar, arriscando a sua própria vida. Isto vindo de personagens que 10 minutos antes queriam ser famosas e ricas. Acho que isto bateu o recorde da mais rápida e idiota evolução de personagens de sempre.

. Epifania súbita dos ensinamentos do avozinho durante a luta final. Cliché: 535, Argumento: -1.

Os efeitos especiais são risíveis. A caracterização, nomeadamente a do Coraçãozinho de Satã e da transformação do Songoku, é muito fraca. O primeiro parece saído do filme “A Máscara” e o segundo aparentemente usou o mesmo fato de macaco usado pelo Macaco Adriano nos tempos do Big Show Sic. Os efeitos usados nos ataques são igualmente fracos; meros espectáculos de fogo-de-artifício que até o 15 de Maio das Caldas da Rainha consegue superar.

Em suma, aconselho sinceramente a quem esteja a considerar ver este filme, que veja em vez “O Ninja das Caldas”. Tem exactamente a mesma história, com a vantagem de os diálogos e os efeitos especiais serem melhores. Além de que não mancha o nome Dragonball.